"Questão a resolver: como conciliar a crença que o mundo é, em grande parte, uma ilusão, com crença na necessidade de melhorar essa ilusão? Como ser simultaneamente desapaixonado e não indiferente, sereno como um velho e ativo como um jovem?" Aldous Huxley

domingo

http://www.youtube.com/watch?v=QbeHq1CLqJ8

Estou improdutiva para textos. Ultimamente escrevo minha tese em duas linhas, e então me foge qualquer inspiração para continar a escrever. É como se, ao colocar em palavras algo no qual eu acredito, aquilo se mostrasse simplesmente tão óbvio que eu não enxergue necessidade nenhuma em alongar-me no assunto. Também ando cansada de discutir comigo os meus dilemas, apenas os ouço e calo. Se por um lado sinto a vontade crescente de nunca mais falar com ninguém e definhar envolta em minha dor infundada, também se faz presente uma preguiça de tudo isso. Preguiça de me fazer triste, preguiça de me destruir. Porque é uma tarefa árdua, saibam. Pensar o tempo todo, sempre a maquinar agulhadas, me vigiar e censurar... Estou entediada comigo. Sabe aquela relação de casal de meia idade em que um já sabe tudo o que o outro vai dizer, como vai reagir e as sensações que isso despertará? Aquele tipo de casal que já está tão enfastiado de tudo que o parceiro tem a oferecer, que simplesmente se viram para lados opostos e abrem um buraco negro na cama de casal, enquanto reconsideram as solidões do dia assim como deve ser: sozinhos. Essa é a minha relação comigo. Velha, desgastada, monótona e impotente. E é isso, a minha tese.
Estou me sentindo completamente doente. De repente eu perdi qualquer expectativa de futuro. Fui para o primeiro colegial empolgadíssima com a chance de ser querida por muitos, a tal popularidade, era algo que eu nunca tivera. Meu segundo colegial foi absolutamente deprimente e eu me deixei iludir pela atraencia de um terceiro diferente. O terceiro chegou, a escola mudou, estou agora convivendo com um grande número de pessoas novas, e querem saber com quantas eu falei? Com duas. No primeiro dia. E só. Agora me pego sonhando com as festas da faculdade. Não havia me ocorrido ainda que eu muito provavelmente não terei uma turma pra ir às festas. Eu sou tímida e introvertida, e dificilmente me deixo gostar das pessoas, então quais as chances de eu realmente curtir tais festas? Acho que vou acabar enfiada em um quarto estudando muito, a sonhar com a vida profissional. Eu já saí com todos os meus amigos, e nenhum deles me fez sentir diferente. Foi legal na primeira vez, claro, mas depois sempre foi tudo tédio e dever social. Estou sempre desesperada por me jogar em quaisquer braços que se predisponham, pois tenho um buraco do tamanho do mundo escondido em mim - nenhum dos tais amigos algum dia percebeu minha gravidade. Na verdade, sinto como se ninguém pudesse entender. Não é que o meu ego seja tão grande que eu ache que não existe pessoa a altura. Na verdade eu me sinto podre e vazia, e estou eternamente sentada no canto a esperar por aquele que me dirá as palavras certas, que terá o toque certo, que preecherá todo o vácuo que eu criei em mim ao tentar me entregar para toda e qualquer pessoa que passasse por perto sabendo que essa pessoa jamais teria tal poder. Eu me sinto mal por quem eu sou. Me sinto mal pelo que eu faço. Eu preciso sobremaneira de algo que me tire dessa escuridão. -----------------------------------------------------------------------

quarta-feira

Impressões

Um lugar fétido, sujo e pervertido. Paredes descascadas, tijolos quebrados e um cheiro horrível. No chão, uma mulher jovem e feia. O rosto marcado pelo barro já seco, a boca escancarada com um filete de sangue e os olhos entreabertos em uma tentativa - teria tentado? - jocosa de desdém. A roupa estava parcialmente rasgada e os braços e pernas caídos de forma nada equilibrada, na mão esquerda jazia um canivete e no corpo pequenos buracos retos dos quais borbulhara sangue quente há pouco, o mesmo que agora seco e estampado na blusa azul causava repulsa e um sarcasmo doentio. Frio, Pressa, Nojo, Enfastio.
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Blusa de frio larga, colorida e fora da moda. De lã. Cabelo bagunçado, vento e chuva, muita chuva. Doces e risadas, um abraço bem apertado, travesseiros e meias. Em cima da cama, com uma escova na mão e uma pluma de aniversário posando de cachecol, uma mulher está a cantar algum hino de fim de formatura com a maior força possível, remetendo a alguma piada interna do grupo de amigas que estão no quarto. Todas riem, uma se levanta, a empurra da cama e toma seu lugar, cantando com expressões ainda mais forçadas, e dançando propositalmente mal. A que fora empurrada cai no tapete, com as almofadas, ri, sobe outra vez e pega a escova com a outra. Cantam juntas. Brigadeiro. Edredrom. Alegria, Despreocupação, Espontaneidade, Carência.
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Quarto. Ele, com outra. Ela na porta. P da vida. Puta da vida. Fudidissma, a maçaneta da porta bate com força na parede. A tal outra sai de foco. Tanto faz: se esconde, foge, vira pó - não é importante. Ele arregala os olhos e se cobre. Ela não chora. Não chora, não fica estática, não sai correndo. Vai, a passos rápidos, para cima dele, e bate, soca, quebra, machuca, com muita vontade e todo o seu potencial. Ele se encolhe. Não xinga nem protege. Aguenta calado. Ela também não xinga. Bate até cansar. E sai. Ódio, Indignação, Agressividade.
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Noite. Sozinha. Perdida. Longe de casa. As letras de neon de uma casa de shows alternativa ditando a aura da rua. Um homem gordo. Cheiro de cigarro. Ela trajando uma saia pink, blusa rendada e salto alto. Fome. Pouco dinheiro. Dois homens mexem com ela, nada obsceno, mas ela resolve andar mais rápido. O barulho do salto no asfalto. Vergonha, Medo, Insegurança.
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Conversas. Respostas rápidas. Palavras jorrando por impulso. Ambos gesticulando confusamente. Risos. Sarcasmos. Entrelinhas e mais risos. Falam sobre assunto nenhum e não parecem nem um pouco preocupados com a densidade e importância dos temas e teses. Às vezes discordam sem raciocinar e na maioria mentem morais sem saber o porquê. Divertem-se. Entretêm. E agradam. Então entra um terceiro na roda, cujos tópicos são mais bem articulados e chamativos. Ela sede o espaço. Logo se perde na discussão e para de tentar se posicionar. Eles continuam a conversar no mesmo rítmo, naturalmente. Ciúme, Raiva, Auto-depreciação.
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Colação de grau. Oitava serie. Orador da turma. Palco. Microfone. As mãos dela estão tremendo e suando, com varias pequenas aglomerações de vermelho por baixo da pele branca e fria, então. Põe o papel no suporte e respira fundo, discretamente, tentando disfarçar o nervoso. Silencio. Todos os olhares. Uma tosse. Sua deixa. Começa, a voz treme, decide olhar para o fundo da sala, começa a proferir as palavras já tão bem ensaiadas. Vai muito rápido, percebe que está fugindo das entonações que ensaiara com tanto apreço, e no caminho seus olhos se encontram com aquele amigo. Ele faz uma careta engraçada e caçoa sobre postura da professora carrasca. Ela ri histericamente, para de falar, olha para as pessoas das três primeiras fileiras. Ele sorri e a olha afetuosamente. Ela volta os olhos para e primeira linha e recomeça o discurso, sem ligar para as palavras que acaba trocando e inserindo um ou outro gracejo improvisado. O discurso acaba. Aplausos. Segurança, Confiança, Aceitação, Amizade.
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Cachorro. Pelos brilhantes e macios. Mau hálito. Latidos. Mordida. [?]
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Entre os zilhões de coisas que me passaram pela mente hoje (influenciadas por músicas, ideias e puro tédio, ilustrando cada sentimento que me contemplou nessa tarde), vomitei aqui os que estavam me dando indigestão.

sábado

Eu estava no ponto de ônibus, terminando de mastigar o meu café da manhã enquanto cantava repetidamete o mesmo refrão de música - que, aliás, cantei o dia todo, sem avançar nem uma frase a mais. Eram seis e pouco da manhã, estava chovendo. Chegou uma senhora. Puxou assunto comigo sobre nossos agasalhos mal costurados, sobre o tempo. Aí brincou dizendo que desejava que a chuva estivesse mais forte para poder não ir trabalhar. Sorri e disse que eu não teria esse direito. Então ela disse que estudar é muito fácil. Ah, claro que é. O mundo todo é mais fácil que o que você tem de encarar. Então ela comentou que começou a trabalhar com nove anos. Fiquei espantada. Perguntei a respeito, e ela disse que com oito já cuidava de duas crianças. Com oito eu só tomava banho sozinha. Me doeu notar o quão mimada eu sou. Nunca enfrentei a vida, nunca tive um único problema real, nunca precisei ser forte. E ainda me acho no direito de chorar. Eu sou infantil até por querer que fosse diferente. Imagina? Querer ter sofrido mais. Só a mais boba das crianças chegaria a conclusão semelhante. Independente de como eu gostaria que tivesse sido, não muda o fato de que eu sou desprezivelmente crítica sem nunca ter tido um único motivo decente. Ah, todos os dias ruins... Não foram nada. É tão trágico olhar pra uma vida e não encontrar nada de impressionante. Tenho vergonha da facilidade com que cheguei até aqui. E nem mesmo asseguro que teria chego caso as circunstancias tivessem sido diferentes. Não. Eu talvez tivesse caido no primeiro falsear do caminho, talvez eu tivesse desistido e hoje fosse algo ainda pior. Mas eu nunca vou saber. Eu deveria usar essa dádiva para me fortalecer sempre que meu espirito negativista me convencer de que as coisas vão mal. Eu com certeza deveria. Ao invés disso, assimilo tudo como uma frustração imprecisa. Decepção.