"Questão a resolver: como conciliar a crença que o mundo é, em grande parte, uma ilusão, com crença na necessidade de melhorar essa ilusão? Como ser simultaneamente desapaixonado e não indiferente, sereno como um velho e ativo como um jovem?" Aldous Huxley

terça-feira

Minha inexatidão

a gafe com chutes por baixo da mesa
o olhar de censura
o cheiro de chuva
a fofoca que ninguém contou
a panela de brigadeiro
o trânsito das sete horas
a briga de rua com torcida
o CD riscado
o pé sujo
a silhueta de um sorriso
o livro grosso e chato
o café quente demais
a impotência sexual
a história repetida
a ideia sem nexo
o clichê hollywoodiano
o plano maquiavélico
o vizinho implicante
a verruga com pelo

sexta-feira

Quem sou eu

Falo de mim na terceira pessoa, e também falo sozinha. Discordo de qualquer coisa, pelo simples prazer de discutir. Sou irônica comigo. Rio e choro pelas mesmas frustrações. Me acho a coisa mais normal do mundo, por mais que tente não demonstrar. Não gosto de sair de casa. Me empolgo e me freio ao mesmo tempo. Nunca me permiti acreditar em algo sério. Sou completamente hipócrita. Tenho a autoestima mais baixa que você já viu, e também o maior ego. Sempre me dou a razão, e sempre te faço acreditar que eu estou certa nisso. Me humilho por prazer. Me sinto sozinha o tempo todo. Sou obcecada por pessoas problemáticas. Fico furiosa com coisas que quase ninguém entende. Tenho nojo de multidões, e finjo repulsa a qualquer contato físico. Adoro quando me alimentam o ego, mas nunca aceitei de verdade um elogio. Sempre acredito no que dizem que eu sou. Meu maior sonho é entrar pra história. Digo aos quatro ventos que amor é superstição, mas continuo idealizando um para mim. Choro antes de dormir, escondida. Sinto ódio mortal quando alguém me pede ajuda com problemas sentimentais. Não gosto de me explicar, mesmo porque eu nunca me entendo. Minto bem quando quero. Me ofendo muito fácil. Pego coisas no ar, e percebo o que eu devo ou não dizer; mas é claro que eu sempre faço o contrário. Nunca terminei nada que eu tenha começado por vontade própria. Sou péssima agindo sob ordens. Gosto de dançar em frente ao espelho. Fico deprimida com frequência. Sempre acho que não vão me reconhecer ou lembrar meu nome. Sou revoltada com os padrões de beleza tanto quanto com a minha beleza. Tenho fascínio por idade média, Irlanda, duendes, ruivas naturais e cavalos brancos. Acho todos os adolescentes ridículos, e me incluo nisso. Odeio todo tipo de dó. Quando vejo alguém, imagino como é aquela pessoa, e acabo demonstrando pelo olhar. Sinto vontade de sumir quando reconheço esse mesmo olhar virado pra mim. Acredito que todos os seres vivos têm o mesmo direito à vida, mas continuo matando baratas. Insegurança me irrita, gírias adolescentes também. Adoro música, livros e chocolate. Me engano tão bem que às vezes acredito. Tenho resposta pra tudo, e se não tenho invento.

Mas se me perguntarem Quem sou Eu...

-> digo meu nome completo e o número do meu RG, há!

segunda-feira

Amor platônico?


O Brasil é um meninão parado, que não entende de música nem de Shakespeare, daqueles que não vêem nexo em brigas ou em tinta pra cabelo. O Brasil é um meninote desengonçado, daqueles que adoram a camisa três números maior. O Brasil é um rapazinho cheio de espinhas, daqueles que espalham bons principios sem intenção nenhuma. O Brasil é um excluido, um invisível. O Brasil é aquele cara que todo mundo inveja nos cantos mais escuros do subconsciente.
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O EUA é uma moçinha na moda, daquelas que lêem revista teen e usam calça colorida.

Tropeços


Eu sinto os sonhos presos em mim. Eu sinto o cheiro das suas mentiras a me sufocar. Falseio com o peso das palavras não ditas... Será que eu ainda vou cair? Hei de cair, todos eles parecem saber. Me observam ansiosos, me vigiam sem me guardar. Quem estenderá a mão a me levantar? Vejo pessoas passando, mas não vejo brilho em seus olhos. Eles fingem muito bem, mas não parecem dispostos a me ajudar. Ouço um sino atordoante, é o sinal de largada... e a corrida começou. Apostando para ver quem chega mais rápido ao fim, ao pódio do eu te disse. Jogando no nada sua ultima gota de suor, esbaforidos com a pressa de saber. Eles vão chegar, cedo ou tarde, e logo a corrida acaba. Vidas gastas em vão, enquanto as palavras pesam mais e mais... e o relógio avança, ele vai me engolir. Corro do tempo, corro dos sonhos, corro da corrida e corro de mim. Duas estradas, por qual seguir? Nenhuma é bela e nenhuma é escura, são só caminhos, caminhos quaisquer. O tempo se aproxima, parece faminto. O extinto de sobrevivência me joga sobre o mato, sem estrada e sem caminho. A folhagem parece dura, mais dura que o chão e mais dura que os erros. Um tapa na cara que soa de medo. Me levanto bem rápido, sem mão, sem nada. Olho pro céu e dou um basta em tudo. O tempo para. Os sonhos esperam. As mentiras ficaram para trás. As palavras me encaram do chão. A corrida acabou. Leve mas não livre, viro meu corpo e caminho à rumo oposto. O sol brilha quente e as flores cheiram a dor. Meu coração se esfria enquanto meus olhos esquecem do amor.

domingo

Um minuto sem verdade


Eu quero um pouco da hipocrisia burguesa, da vida inventada, da classe imaginária. Quero um pouco do glamour, dos cortejos, da burrice bem polida. Quero um pouco daquela maquiagem, e um pouco daquele sorriso estampado. Quero ouvir só coisas belas, e falar só o que quiserem ouvir. Quero um minuto sem verdade.

Pra onde foram

as ideias revolucionarias, a paixão pela vida, pelo real, pelo momento?

sexta-feira

Querido Amigo,

Será que poderias me contar mais uma vez aquela história sobre auto confiança? É que Glória tem falado muito sobre essa história, mas eu acredito que ela esteja contando errado.

sábado

Sobre a ataraxia politica.


Desde o grito da informática, que chegou com a terceira revolução industrial, jovens do mundo inteiro se esqueceram de contestar a sociedade, politica e economia mundial; para se trancarem em seu próprio mundo, onde regem suas próprias leis e onde os aborrecimentos daquela existência cada dia mais complexa não entram. Depois de pouco tempo, a juventude estava tão desintegrada do sistema vigente que qualquer intervenção por parte desta perdeu o sentido. E é aí que nós estamos. Agora, convenhamos: o sistema político, satisfatório ou não, foi projetado por pessoas incomparávelmente mais engajadas que a nossa geração; por tanto nossa falta de atitude, de vontade ou de ideais é simplesmente coerente. De todo modo, sistema nenhum é perfeito, então por que é tão dificil de se aceitar que o atual é correspondente ao nosso momento histórico? Acho que é hora de enxergar que revolta nem sempre é a melhor conduta. Às vezes, integração já basta.

sexta-feira

" Sorriu.
E no seu sorriso já havia garras.
Uma aluvião de cenas, que ela jamais tentara explicar e que até aí jaziam esquecidas nos meandros do seu passado, apresentavam-se agora nítidas e transparentes. Compreendeu como era que certos velhos respeitáveis, cujas fotografias Leónie lhe mostrara no dia que passaram juntas, deixavam-se vilmente cavalgar pela loureira, cativos e submissos, pagando a escravidão com a honra, os bens, e até com a própria vida, se a prostituta, depois de os ter esgotado, fechava-lhes o corpo. E continuou a sorrir, desvanecida na sua superioridade sobre esse outro sexo, vaidoso e fanfarrão, que se julgava senhor e que no entanto fora posto no mundo simplesmente para servir ao feminino; escravo ridículo que, para gozar um pouco, precisava tirar de sua mesma ilusão a substância do seu gozo; ao passo que a mulher, a senhora, a dona dele, ia tranquilamente desfrutando o seu império, endeusada e querida, prodigalizando martírios que os miseráveis aceitavam contritos, a beijar os pés que os deprimiam e as implacáveis mãos que os estrangulavam.
- Ah! homens! homens!... sussurou ela de envolta com um suspiro."

O cortiço,
Aluísio Azevedo