"Questão a resolver: como conciliar a crença que o mundo é, em grande parte, uma ilusão, com crença na necessidade de melhorar essa ilusão? Como ser simultaneamente desapaixonado e não indiferente, sereno como um velho e ativo como um jovem?" Aldous Huxley

sábado

Eu estava no ponto de ônibus, terminando de mastigar o meu café da manhã enquanto cantava repetidamete o mesmo refrão de música - que, aliás, cantei o dia todo, sem avançar nem uma frase a mais. Eram seis e pouco da manhã, estava chovendo. Chegou uma senhora. Puxou assunto comigo sobre nossos agasalhos mal costurados, sobre o tempo. Aí brincou dizendo que desejava que a chuva estivesse mais forte para poder não ir trabalhar. Sorri e disse que eu não teria esse direito. Então ela disse que estudar é muito fácil. Ah, claro que é. O mundo todo é mais fácil que o que você tem de encarar. Então ela comentou que começou a trabalhar com nove anos. Fiquei espantada. Perguntei a respeito, e ela disse que com oito já cuidava de duas crianças. Com oito eu só tomava banho sozinha. Me doeu notar o quão mimada eu sou. Nunca enfrentei a vida, nunca tive um único problema real, nunca precisei ser forte. E ainda me acho no direito de chorar. Eu sou infantil até por querer que fosse diferente. Imagina? Querer ter sofrido mais. Só a mais boba das crianças chegaria a conclusão semelhante. Independente de como eu gostaria que tivesse sido, não muda o fato de que eu sou desprezivelmente crítica sem nunca ter tido um único motivo decente. Ah, todos os dias ruins... Não foram nada. É tão trágico olhar pra uma vida e não encontrar nada de impressionante. Tenho vergonha da facilidade com que cheguei até aqui. E nem mesmo asseguro que teria chego caso as circunstancias tivessem sido diferentes. Não. Eu talvez tivesse caido no primeiro falsear do caminho, talvez eu tivesse desistido e hoje fosse algo ainda pior. Mas eu nunca vou saber. Eu deveria usar essa dádiva para me fortalecer sempre que meu espirito negativista me convencer de que as coisas vão mal. Eu com certeza deveria. Ao invés disso, assimilo tudo como uma frustração imprecisa. Decepção.